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Ponto final

É muito interessante ser o décimo primeiro filho, mas também provoca sensações estranhas à maioria das pessoas. Quando nasci o mais velho já estava fora de casa. Estudava no Colégio Militar. Nós morávamos em Guajará-Mirim (cachoeirinha em português). A última fronteira da dimensão Klingon. E de lá saí antes de respirar direito o oxigênio da floresta. Dos quatro anos de Maceió, etapa seguinte da jornada, me lembro do Luís (hoje Pontes) tentando correr nas paredes de uma garagem. De um alpendre, que até hoje não sei como era, mas lembro de como as palavras eram bonitas nas vozes de meus irmãos. De um sapo cururu. E do dia da "pisa". O dia da pisa foi um momento bem engraçado. Eu estava no quarto brincando com o Normando (hoje Tom) e ouvi a voz grossa do papai chamando cada nome. Quando chegou no meu, alguém, não lembro se o Rui ou o Márcio (hoje Mau), disse que papai estava chamando para nós apanharmos. Fiquei numa fila sem saber o que significava "apanhar". Quando chegou na minha vez, nada aconteceu. Foi uma "pisa" muito frustrante. Não doeu, não chorei, não sei porque deveria ter medo. Mas voltamos para Rondônia. Agora eu já entendia um pouco mais as coisas, mas ainda não sabia muito bem como viver. Das lembranças desse período falo outro dia. Em 77 fomos para Belém. Lá nós moramos numa casinha muito ruim, antes de irmos para a vila militar. Lembro de como aprendia com os livros de meus irmãos e com as aprontações de cada um. Os pontos altos dessa época foram o nascimento da Lia, 78, e a copa de 82, quando a vila todinha, agitada pela turma do Rodolfo (hoje Marcos) pintou o asfalto das ruas com os motivos da grande seleção do Telê. O fato é que via a vida do mesmo jeito que assitia TV. Os erros e os acertos que podia imaginar já tinham sido cometidos pelos meus irmãos. As surras, as broncas, os namoros. Tudo o que pudesse fazer seria comparado ao que os dez primeiros fizeram. Passei muito tempo expectando a vida alheia e sentindo o "certo" e o "errado" pelos olhos de quem os criticava/elogiava. A última parte dessa história alheia na minha vida foi a vinda para Porto Velho, em 88, quando todos os sonhos se voltavam para uma construção nordestina de futuro. Demorei demais a me livrar da idéia que deveria permanecer onde me deixassem e fazer o que me mandassem, para não ficar "igual a...". Hoje tenho vida própria, ou quase. Limitada pelos compromissos familiares, acadêmicos e trabalhistas. Mas certamente passei a ter uma referência diferente de vida. Com certeza mais própria, mas ainda ligado à profecia de ser "o ponto final".