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Sem nome

Apesar do tempo que passei me sentindo pequeno, não tive uma ideia de mundo a la "Bob", aquele do velocípede. Realmente não entendia bem as coisas. Não entendi o dia que a Sônia apareceu chorando lá em casa (se é que era Sônia mesmo o nome dela). E espero que ninguém tente explicar isso em público. E a Vera? Sujeita oculta, que circulava nas falas dos mais velhos. Quem estaria namorando com ela? Pelo jeito ninguém! Lembro do dia que o Jr. resolveu gravar uma fita comigo, imitando um cântico onde um garoto fazia uma voz bem de garoto. Mas o resultado foi dos piores. As razões dos fatos não estavam muito claras na minha mente. Por isso gostava do Mr. Magoo, o cara que não vê nada mas se dá bem em tudo. Uma vez, no Natal, saímos para a igreja, alguns de nós, só me lembro da Inês, enorme, que não me deixava segurar sua ão porque eu já era grande. As árvores das ruas estavam com aquelas lâmpadas coloridas, que para mim representavam algo de muito ruim, não fazia sentido na minha cabeça aquelas luzes coloridas, muito menos em cima de uma árvore. Talvez se eu as visse em outro lugar, achasse que seria interessante deixá-las nas árvores de vez em quando. Mas aquele negócio só aparecia no Natal. Fomos andando para a igreja, e não me lembro de mais nada. É legal ter pouca memória porque a gente só se lembra dos flashes. Lembro de um dia na igreja presbiteriana, que ouvia as moças falarem com um "s" sibilante, e achava engraçado aquilo, porque só acontecia na igreja, ninguém que eu conhecia lá fora falava daquele jeito. Mas eu não ria de ninguém, porque tinha medo de tomar cascudo. E por falar em cascudo, lembro do dia que sugeri que o Rodolfo poderia ser chamado de Marcos. Até hoje não sei porque me bateram. E o cara agora assumiu o segundo nome, mas nunca vão saber que a idéia foi minha, rsrsrs. O Rui não poderia ser chamado de Carlo, porque alguém poderia confundir com Carmo, e não ficaria bem. Já o Jr. poderia ser Francisco, Chico, Chico Moura, mas ficou só com o Moura. Sorte dele. Eu fiquei com um nome ruim, Ronaldo. Pensa bem. Primeiro foi o presidente americano, Ronald Reagan. E até hoje tem quem me chame assim. Depois meu filho começou a gostar de futebol em plena Copa de 94, o Brasil foi campeão, mas o bebê só falava da Noruega, o nome era mais bonito. E foi a Noruega que o fez aprender a escrever com apenas 3 anos (um dia conto a história). Não satisfeito, logo começou a pedir que o chamassem de Ronaldo, mas não por causa do pai, por causa do dentuço. Beleza, dei-lhe uma camisa do Palmeiras e o "do contra" tornou-se corintiano. Desisti de levá-lo pelos meus caminhos, mas tive que aguentar o Galvão gritando Tafareeeeeeeeeellll e Ronaaaaaaaaaaaaallllllldo. Quando isso acontece toda semana, você fica torcendo que o cara quebre a perna, e o cara quebrou. Recuperou-se e virou Fenômeno. E por associação eu virei também. Vale dizer que não fiz nenhum esforço para assistir a copa em 2002. Aí aparece outro Ronaldo, mais novo ainda, para estender o prazo da gozação. E o cara é bom de bola. Agora os amigos, colegas de facudade e de trabalho já não sabiam mais como me chamar, mas não importava, de qualquer jeito sempre imitam o Galvão. A gente leva a vida, tudo bem. Fazer o quê? E quando o fenômeno resolve sair com as "traveco"? Ninguém se toca que ele estava com a camisa do Flamengo, só lembram do nome. Eca! Ainda aparecem outros, Ronaldo Ésper (o cara é viado! Se toca mano!), e um monte de Ronaldo bandido que surge por aí e o povo diz: foi você, Ronaldo? De onde você menos espera as coisas surgem. Criei uma conta no Skype e resolvi treinar um pouco de conversação em inglês. Logo no primeiro dia me aparece um cara da Bulgária: - Você é o Ronaldo, mora no Brasil? - Sim, eu moro. - Então você joga futebol. Uh! E isso se repetiu com um grupo de estudantes marroquinos. Deletei meu Skype na hora. Quando você pensa que está se acostumando começa a entrar nos ambientes e ouvir seu nome sendo chamado, dessa vez de uma maneira mais curta, sem gritos, mas muito enjoada, um simples "ronaldo" seguido de muitas risadas. Pois não é que um mané, corintiano prá variar, me dá uma entrevista com recado pro jogador e o pessoal do pânico usa como gozação? Então, meus queridos, façam como eu, coloquem nomes fáceis nos seus filhos, daqueles que em cada grupo que eles estiverem possam se repetir quatro, cinco vezes. Ou ponham nomes compostos, para que eles tenham opções. Porque assim, incluídos na multidão, eles terão melhor chance de ter um nome. Abraço a todos (se não aparecerem os parágrafos é pq. estou com o mesmo problema que o Márcio).